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Manifesto Expedativo: Animalidade como Resistência

Todos temos o direito de existir e de viver em nossa plena essência.

Essência essa que se exaure à medida que nossos corpos são desconscientizados do seu potencial animal.

Porém, não estamos aqui para acender fogueiras e recitar narrativas místicas sobre o retorno ao selvagem-sagrado. 

 

Afinal, o selvagem não é a fantasia de uma natureza crua, nua e sem pudor, cujo guia do breu é o brilho das estrelas -Operárias fiéis de seu destino.

Reduzir o selvagem a esse lugar seria condenar a espécie humana e as espécies-para-além-de-humanas. E nosso papel não é cercear. É expandir.

Expandir de forma respeitosa e consciente. Reconhecendo-se em territórios.

A natureza é mais do que morrer. Seu morrer acontece amalgamado ao seu reacender. É rizoma. E, acima de tudo, é desejo.

Talvez um desejo quieto, adormecido sob as exigências financeiras e das responsabilidades.

Mas ainda ali.

Persistindo.

Manifesto na gargalhada sincera, no humor como enfrentamento, nas respostas criativas.

Desejo de viver com sentido.

E o sentido desse manifesto? resgatar a animalidade

_____________________ O MANIFESTAR____________________________

É sabido desde outros planetas, que os artistas aqui presentes fazem parte uma grande família multiespécie urbana. Portanto, a animalidade se faz constantemente presente na rede de afetos deste território.

Desde pequena, sonho com a realização deste espaço, onde seres das mais diferentes Ordens encontram um território de coexistência. 

Como pessoa urbana, minha relação com os animais se diferencia da cultura imposta pelos meus pares, pois ela se evidencia na horizontalidade.

Quando pequena, pedia licença aos pombos para entrar na praça. Alimentava os gatos na rua, atitude malquista pelos humanos defensores da vida sanitária com cheiro de álcool hospitalar. Também transformei em televisão as janelas de uma casa abandonada pela minha espécie e habitada por ratos dos mais diversos tons de cinza. 

Com os anos, a selvageria se refinou. E continuou a habitar na urbanidade. 

Morar em uma família multiespécie dentro da urbanização evidencia o contraste entre pessoas e outros seres. A casa se torna uma amostra orgânica, viva e latente no meio do concreto. O viver se transforma em uma exposição animalia.

Pessoas que cruzam a rua todos os dias param para observar uma planta que não viam desde a infância, na casa da avó. Muitas experimentam, pela primeira vez, conhecer um coelho - E reconhecer um pato para além do prato. Ousam perguntar se os animais são vendidos ou alugados para escolas e eventos infantis, como se fossem objetos passíveis de transporte e apropriação.

Desde então, a estética animal urbana saltita diante dos meus olhos.

Quais são as imagens desses animais? Com que direito alguém se sente no poder de pertencimento sobre corpos de forma tão escancarada? Como é a imagem do animal urbano? Tão aculturado pela nossa espécie e, ao mesmo tempo, tão resistente à aculturação?

Os animais não humanos são invisibilizados, silenciados e têm suas imagens exploradas em benefício dos homens. Suas expressões e comunicações não são acolhidas, nem dignas de acolhimento. Na urbanização, observamos algumas imagens recorrentes:

Corpos geradores de lucro

Nas enchentes que assolaram o Rio Grande do Sul em maio de 2024, a manchete do G1 afirmava a morte de 1,1 milhões de aves provocavam danos para o agronegócio. 1,1 milhões de galinhas, perus, patos, mortos... Mas a manchete era sobre o déficit ecônomico. Afinal, os corpos de animais-não humanos são propriedade e lucros para nossa espécie, sem direito a ter subjetividades e existências.

Corpos salvos sem pedir

Corpos desnutridos, desidratados, maltratados e assustados são expostos como espetáculo da dor nas redes sociais. Humanos os resgatam, mas sem hesitar em explorar esses corpos frágeis para consolidar o papel de salvador. A pena do espectador financia o trabalho. O sofrimento é o que toca e motiva.

O corpo feliz é passível de assassinato.

Corpos antropomorfizados

Por outro lado, animais vestidos, dançando, antropormifazados, são retirados de seu lugar de espécie para satisfazer as carências emocionais humanas.

Corpos explorados 

 

Desprender milhões de reais em uma pesquisa sobre a existência de empatia em animais. Em pleno 2025.
Sedar um camundongo, animal cujo processo de sedação é extremamente violento e perigoso.
Colocá-lo em posição de morto.
Mostrar o corpo falso morto para alguém com quem ele cresceu e tem um laço afetivo.
Deixar o animal cobaia se desesperar e tentar salvar o outro. Registrar o instinto que fez esse animal agir, sem precisar racionalizar. Atestar que existe empatia em outras espécies.

Publicar em uma revista científica.

A empatia precisa ser cientificada para quê? E para quem?

​...

Recentemente, vi um vídeo de um corvo construindo ninhos com cabides. Se foi inteligência artificial ou não, a pergunta continua:

Como esses corpos conseguem se manter fiéis à sua essência quando tentam destruí-la constantemente?

O animal é um resistente e a convivência com ele é um ato de resistência. A luta pela animalidade é uma luta pela pluralidade dos modos de existência. É a quebra do monopólio humano sobre o sentido de ser.

 

Lutar pela animalidade é lutar intrinsecamente pela humanidade. Não há separação entre uma luta e outra. Os corpos são fragmentados de forma feroz e semelhante. Atire a primeira pedra quem não se sentiu identificado com alguma  parte deste manifesto?

A relação com as espécies companheiras é um ato criativo, no qual a arte se transforma em ponte. Criatividade e arte são a ponte relacional entre as espécies. Cuidar do outro é cuidar do nosso lugar. 

Ao criar juntos—humanos e não humanos—abrimos caminho para novas possibilidades de existência, onde os corpos não são capturados, mas coexistem em liberdade.

O animal é um resistente. 

E conviver com eles é um ato de resistência.

© 2035 por Ateliê Bicho. Orgulhosamente criado pela família multiespécie.

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